sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Juventude Transviada - Parte II

Não é à toa que este filme gerou polêmica. Pela primeira vez, utilizaram a indústria cinematográfica para dar voz à nova geração e mostrar a realidade de jovens comuns, criando anti-heróis. No segundo disco do DVD, que continha informações extras do filme, encontramos comentários da equipe de produção a respeito da intenção do diretor:
“O diretor percebeu que isso era em função da família, não em função da situação econômica. Era o ódio deles, por serem criados por gente cujos valores eles consideravam antiquados. [...] Explicações precisavam ser encontradas e isso certamente era alimento para Hollywood.”
“Todos sabem que delinquentes vêm de lares pobres, eles surgem da pobreza; já esses garotos frequentam boas escolas, têm boas famílias, eles não caíram no crime.”
Isso é auto-explicativo para a frase localizada na capa do DVD: “...e ambos vieram de boas famílias!”. A intenção do filme não é retratar os jovens problemáticos por causas sociais, e sim os que, aparentemente, não têm causa alguma (rebelde sem causa) e demonstram insatisfação perante sua própria realidade, um desejo de mobilizar algo, revertido em vivências dramáticas e necessárias.
Cinco cenas foram selecionadas para a análise, que visa salientar apenas alguns pontos importantes de cada uma delas.

Cena 1: Judy na delegacia

Choque de valores entre Judy e seu pai que associa o batom vermelho a ser vagabunda. Ambos não conseguem compreender as intenções um dos outro.
Judy não é mais uma menininha, muito menos uma mulher, tornando difícil o acerto na medida ideal de comportamento. Censurada por beijar o rosto do pai e insultada por usar batom vermelho, ela se sente odiada pelos pais, que claramente não estão preparados para conviver com a filha que cresceu em um coorte posterior ao seu.

Cena 2: Jim na delegacia


Jim – “Por favor, me prenda. Vou bater em alguém, vou fazer alguma coisa...”
O jovem rebelde sem causa pensa que não será compreendido e por isso não tenta explicar o que sente, partindo para atos insolentes.
Jim- “Eles (pais) nunca entendem...
[...] Se houvesse um dia em que eu não me sentisse confuso, que eu não sentisse vergonha de tudo, que sentisse que pertenço a algum lugar. Sabe?”

A situação, apresentada há quase seis décadas atrás, é atemporal no ponto de vista do jovem em relação aos seus problemas que são sempre insolúveis e mais complicados do que os do próximo.

Cena 3: Diálogo no penhasco - Jim e Buzz

Antes da famosa corrida, que teve consequências deploráveis, os supostos inimigos trocam palavras na beira do penhasco.

Jim – E por que vamos fazer isso?
Buzz – Temos de fazer alguma coisa. Não acha?

Algo precisa ser feito, mesmo não havendo mais razões para que disputem este desafio.


Cena 4: Discussão com os pais


Jim – Eu acho que não posso andar por aí provando coisas e fingindo que sou durão.
[...] Pai – Não pode ser idealista a vida toda.
[...] Jim – Pai, queria que eu dissesse a verdade. Não disse isso? [...] Só contar uma mentirinha?
Pai – Aprenderá quando for mais velho.
Jim – Não quero aprender dessa forma.

A posição dos personagens na cena deve ser destacada, pois representa exatamente a realidade desta família em crise. A mãe, ao alto, é a personagem que profere a última palavra dentro de casa, fazendo com que suas ideias e desejos sejam prevaleçam sobre o pai, que ocupa a posição mais baixa não apenas na cena. A submissão do pai ao que é imposto pela mãe é visto como absurda e humilhante por Jim, sendo este mais um fato que desperta a revolta do rapaz, sempre entre estes conflitos entre pai e mãe, entre a última palavra e aquela que já é lançada de forma insegura.

Jim associa o acidente ocorrido ao pai, jogando-lhe parte da culpa.


Cena 5: Jim e Judy


Judy diz “Não deve acreditar no que digo quando estou com eles. Ninguém age com sinceridade.”

O grupo de amigos que deveria ser o refúgio destes jovens é, na verdade, apenas mais um cenário repressor, onde não podem agir com sinceridade, buscando sempre conservar a imagem de algo que talvez nunca tenha existido. A necessidade de mostrar/fazer algo, de chocar essa sociedade, de sentir que estão ferindo o sistema, condena aqueles que querem se rebelar a uma ausência de liberdade ainda maior.
A mansão abandonada, que inspiraria uma série de filmes de terror, é o lugar onde todos os medos e preocupações se dissolvem, é onde estes adolescentes “perdidos” experimentam a liberdade que não possuem na sua vida prosaica. Ali eles finalmente guiam-se apenas pela sinceridade e por seus desejos e em momento algum nos são apresentados como aqueles jovens transgressores anunciados através do título do filme. Sem pressões externas eles são aquilo que se esperava de jovens civilizados, são inofensivos.

Juventude Transviada - Parte I



Título Original: "Rebel Whithout a Cause"
Direção: Nicholas Ray

Roteiro: Nicholas Ray, Irving Shulman, Stewart Stern
Origem: Estados Unidos
Ano de lançamento: 1955
Duração: 111 minutos

Elenco:
James Dean (Jim Stark)
Natalie Wood (Judy)
Sal Mineo (John Crawford - Platão)
Jim Backus (Frank Stark)
Ann Doran (Sra. Stark)
Corey Allen (Buzz Gunderson)
William Hopper (Pai de Judy)
Rochelle Hudson (Mãe de Judy)
Dennis Hopper (Goon)
Edward Platt (Ray Fremick)
Steffi Sidney (Mil)
Marietta Candy (Enfermeira)
Frank Mazzola (Crunch)

Dirigido por Nicholas Ray, Juventude Transviada retrata, de maneira ousada para a época, a juventude dos anos 50. A trama é composta por apenas 54 horas da vida de Jim Stark, um adolescente que, por causa dos pais que decidiam mudar de cidade toda vez que ele metia-se em encrencas, costumava fugir de seus problemas sólidos (exceto dos próprios pais) e continuava a cometer atos inconsequentes em virtude de seus conflitos internos que, na verdade, eram consequências da sociedade (externa).

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O cinema e a juventude


O cinema, definido também como “indústria do sonho”, cumpre sua função social como arte. A projeção do real, ou daquilo que se deseja ou não como modelo de realidade, leva à sociedade novos pontos de reflexão sobre seu meio de vida e comportamento, entretendo através da reprodução do “cotidiano” ou dramatizando questões triviais ou cruciais.
Nosso grupo, composto por jovens de 16 e 17 anos, depara-se com uma série de filmes produzidos para a juventude e com aqueles que a abordam como tema. A representação desta turbulenta fase da vida, na qual diversas perspectivas são ampliadas (inclusive sobre o tempo, que começa a ser percebido como um fator determinante), e onde as infinitas possibilidades de escolha condenam o jovem, nem sempre preparado, a um futuro imediato - tornando-o inteiramente responsável - apresentou-se para nós como um assunto interessante para estudo.
As juventudes – esta será a definição utilizada para não generalizar os jovens que também são consequência de sistemas de educação, condição e criação diversos - representadas no cinema merecem ser dissecadas, e assim, analisadas.
O que é atemporal entre todas essas juventudes que não viveram o mesmo coorte (mas que, espantosamente, apresentam tanto em comum), qual é a determinância do meio e da época em que estão encaixados e seu comportamento diante do mundo contemporâneo, e de que forma chegamos à estas juventudes modernas são algumas das questões.
Na foto, uma das melhores cenas do filme "Os Sonhadores".

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O Habeas Corpus da Juventude no Cinema é a identidade do blog que coexistirá e servirá como um complemento do nosso projeto de pesquisa chamado, provisoriamente, de “Adolescendo a Sétima Arte”. A ideia do projeto surgiu em junho de 2010, no colégio São Judas Tadeu, localizado em Porto Alegre – RS, onde os professores Graziela, de História, e Janio, de Filosofia, sugeriram a elaboração de uma pesquisa para a mostra no Salão de Atos da UFRGS, em outubro deste mesmo ano. O grupo, composto atualmente por Gabriel Pessoto, Luiza Nascimento, Rodrigo Cirne e Pedro Braathen, aceitou participar e, após uma semana, os orientadores trouxeram o tema “Juventude no Cinema”, onde analisaremos conceitos de juventude e filmes que a abordam. Nós adoramos.
A ideia do blog é utilizar o termo “Habeas Corpus”, que é um instrumento que alega tua liberdade como cidadão, para concedê-lo às juventudes, pois este é um direito que poucas vezes lhes foi dado ao longo da História. Através de rótulos e estereótipos, os jovens têm sido representados no cinema por décadas sem haver, na maioria das vezes, uma reflexão por parte do público sobre o comportamento destas juventudes julgadas e classificadas erroneamente. Até a rebeldia e a marginalização podem ser explicadas e perdoadas, afinal, nesta fase, crises existenciais reformam a personalidade da pessoa gradativamente.

[...]Peço-lhe que tente ter amor pelas próprias perguntas, como quartos fechados e como livros escritos em uma língua estrangeira. Não investigue agora as respostas que não lhe podem ser dadas, porque não poderia vivê-las. E é disto que se trata, de viver tudo. Viva agora as perguntas. Talvez passe, gradativamente, em um belo dia, sem perceber, a viver as respostas.
Rainer Maria Rilke - Cartas a um jovem poeta